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Haver... Havia.... Não era grande coisa... Mas haver havia...
Imagem: GC e Robinson Kanes
Mon royame est de c'est monde.
Albert Camus, in "L'Envers et l'Endroit" (Amour de Vivre) - Camus cita os gregos contrariando o que Cristo respondeu a Pilates em João, XVIII, 36
Não tento sobreviver ao vírus, tenho as minhas cautelas, os riscos existem, isso basta-me para me sentir bem - no que concerne à desgraça, lamento não dar para o peditório, usando as palavras de um dos visitantes deste espaço.
Procuro sobreviver ao agudizar da hipocrisia (agora as políticas governamentais já são más, mas há uns meses chamavam a quem tal afirmava de idiota) numa fase em que temos de garantir a paz e a calma, agora é tarde e também é cedo para apontar armas. Agora não é tempo de discursos da moral, das opiniões que mudam segundo as redes sociais, segundo a turba e as diferentes plataformas, noticiosas e não noticiosas. Como se muda de opinião de um minuto para o outro, hoje em dia... Ainda bem que tal, maioritariamente, só acontece a quem usa o teclado de forma pública... Ainda bem...
Tento sobreviver ao pânico e ao medo, não em mim, mas junto de alguns que me rodeiam, não é fácil quando tenho uns minutos face aos meses de invasão grosseira da mente que tantos continuam a perpetrar a troco de leituras e audiências. Talvez agora me chamem de idiota, como "chamaram" há uns tempos... Mas perdoem-me não resistir ao mordaz e cínico: eu bem dizia! Leia-se eu como um grande "nós".
Não exploro esta situação como uma espécie de carona invertido, não me coloco como especialista em saúde, apenas alguém que diz umas coisas e que parece que ao invés de procurar holofotes, teima em disparar sobre qualquer luz que se acenda - uma busca por não sofrer por aquilo em que não acredito, pois isso faz-me não acreditar na vida e não a pretendo jogar à aventura, socorrendo-me aqui "Do Mundo Original" do grande VF . Talvez um dia me arrependa, quiçá...
Nessa sobrevivência, e não sendo um homem que aprecie as quatro paredes de um escritório, por vezes é necessário uma retirada, não gosto da palavra meditação... Sair das gentes, pensar a sós, isolar-me desse mundo nem que o escritório mais formal dê lugar ao assento de um carro ou mesmo a um tijolo qualquer numa praia ou beira-rio desprezada e pejada de detritos.
Retiro-me, não escuto o "Addio a Palermo", de Morricone e composto para o filme "Corleone", como por estes dias mencionei ao amigo João-Afonso. Procuro outras sonoridades, talvez me faça bem agora o "Vacío Sideral" de Miguel Ángel Delgado e do espectacular albúm "En Mundo en la Boca".
Deixo que o vento me misture os pensamentos, o meu reino é, de facto, deste mundo... De um mundo que desconheço e que rapidamente oscila entre o discurso mais terno e a mais ignóbil descarga de ódio. Um mundo de faz de conta ou talvez não... Talvez esse reino seja mesmo assim e os restos de acomisme sejam isso mesmo, detritos de uma esperança que nunca se concretizará - o melhor dos mundos poderia ser hoje e não é, porque terá de ser no futuro que se avizinha ainda mais desafiante e sedento de Homens sem conseguir livrar-se de wannabes. A Terra bem roda... Mas teima em não conseguir sacudi-los para fora da sua órbita ou sequer transformá-los em húmus transformando podres almas em saprófitas.
Acabo este texto a ouvir Davide Salvado, e o seu galego inconfundível... Talvez o "Aire" de um dos melhores músicos da Ibéria me possa inundar e me dar todas as forças para vencer mais um dia em que sei que tenho de estar bem para que outros também possam estar. Preciso dos ares de lá... Sufocam-me os ares de um rectângulo fechado sobre si próprio... Um rectângulo irrepresentable de García Lorca mas com uma náusea perpétua cujas metástases corrompem um dos solos mais ricos do Mundo.
São horas de levantar, aguardo mais uns minutos. Fecho um pouco os olhos e deixo que o Tejo se transforme na Avenida de la Constitución em Granada... Permito-me, eventualmente, a ter dois dedos de conversa com o poeta e com o dramaturgo acerca da revolução social antes de voltar ao reino.
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